A GREVE
Os alunos do Secundário das escolas do concelho decidiram reservar o dia de hoje para protestar contra as aulas de substituição. Quando cheguei, uma enorme e ruidosa concentração fazia-me adivinhar o pior. Entrei, juntamente com alguns alunos, pela porta do estacionamento para evitar grandes atrasos. Na aula das 8h20 tinha duas alunas à minha espera, um terceiro, amedrontado, chegou pouco depois. As duas alunas tinham decidido assistir à aula, um direito que lhes assiste e para o qual o Estado contribui com largos milhões de euros em cada Orçamento, de livre e espontânea vontade. O aluno veio com medo de represálias do Encarregado de Educação, um pavor ainda maior do que a chacota dos restantes grevistas da turma.
«A professora vai marcar faltas?! NÃO PODE!!». «Claro que vou. Quem decide usufruir do direito à greve, tem de assumir as responsabilidades de tal escolha. Os professores e todos os outros trabalhadores quando aderem a uma greve têm sempre falta e não recebem remuneração nesse dia». «Mas disserem-nos que não podia marcar falta a ninguém, nem era preciso justificar». Desisti. Com alunos do 7º ano de escolaridade tão politizados é inútil argumentar. Diga-se de passagem que a aula decorreu agradavelmente com a revisão da matéria leccionada nas últimas aulas.
Entretanto, a hoste reunida no portão principal da escola começara a dispersar. Os arames que haviam introduzido nas fechaduras dos portões tinham sido retirados, mas só depois de se desmontarem as fechaduras, que ficaram inutilizadas (quem paga os estragos?). No segundo bloco da manhã já as aulas funcionavam normalmente, com a presença de todos os alunos.
Acrescente-se que na escola secundária onde actualmente lecciono as aulas de substituição funcionam de forma muito organizada. Quem procurar um libelo de uma docente do ensino secundário com doze anos de serviço contra as aulas de substituição veio bater em porta alheia. Sou totalmente a favor das aulas de substituição. Tranquiliza-me saber que, se tiver uma consulta médica ou adoecer e não puder trabalhar, os meus alunos estarão na sala de aula com actividades por mim seleccionadas ou escolhidas pelo professor designado para substituir-me, se adoecer de repente. A escola estabeleceu também um sistema de permutas, a que recorri quando tive que deslocar-me a um hospital público para consultas e exames ou participei num colóquio.
Por outro lado, já substitui, neste ano lectivo, mais de uma dezena de colegas: dei aulas de matemática, inglês, geometria descritiva, desporto, biologia, saúde e socorrismo, geografia e ciências naturais. Só uma vez fiz uma substituição de francês, uma das minhas áreas de formação. As aulas de substituição decorreram muito bem, sobretudo quando os colegas deixaram o plano de aula, o que aconteceu em 50% das vezes. Quando tal não aconteceu, dirigi-me à estante com exercícios e fichas de trabalho de todas as disciplinas e, muitas vezes com a ajuda dos colegas da disciplina, seleccionei uma série de actividades a desenvolver na aula de sunstituição. Só uma vez, numa aula das 8h20, não tendo a colega podido deixar o plano de aula, optei por actividas lúdicas. Os alunos de um 9º ano escolheram um filme, que a delegada de turma foi requisitar à biblioteca. Jurei que nunca mais me metia noutra. Ao fim de 20 minitos, já ninguém ligava ao filme e vi-me grega para manter os alunos sentados e calados.
Tudo isto para dizer que os alunos da minha escola não podem ter razões de queixa das aulas de substituição. Podem discordar ter que vir, numa manhã ou tarde, de propósito à escola para ter uma aula substituição, ou da possibilidade de sairem mais cedo no final de cada turno para evitar a hora de ponta. Estas greves contra as aulas de substituição que pululam em quase todos os distritos e animam os noticiários não têm a mínima razão de ser e esta medida é talvez a única decisão relacionada com a educação tomada por este governo digna de louvor. Quanto às restantes medidas, nomeadamente o ECD, esperem pelos próximos capítulos, que o intervalo acabou e tenho de ir substituir uma colega de inglês. Já tenho as fichas de trabalho preparadas desde ontem à tarde.
evva
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