O Inferno recomeça nas próximas semanas
(texto de João Pereira Coutinho, publicado na Única de 30 de Agosto de 2008)*
O mais grave não é apenas permitir que 'alunos' destes continuem no 'sistema'. Grave, grave é obrigar os outros alunos, que estão no Ensino Público (porque não têm outra alternativa ou porque assim escolheram) e que estudam, se dedicam, obtêm bons resultados no meio do maralhal da baixa fasquia de exigência que este tipo de integrações exige, a subsistir num meio que não investe no total aproveitamento e incremento das suas capacidades.
Alguém fora do 'sistema' consegue imaginar a quantidade e a qualidade dos sapos que se engolem em cada ano lectivo? O quanto dói ver alunos com capacidades subaproveitados em turmas problemáticas ou que integram alunos com NEE? Quando folheio os dossiers de testes e fichas de trabalho que acumulei em pouco mais de uma década de docência (eu que tenho a mania de guardar tudo), uma dor ulcerina revolta-me o estômago. Ano após ano, a exigência vai diminuindo e se me atrevesse a aplicar (olhó eduquês de calidade) um teste de avaliação de há cinco anos numa turma com o mesmo nível de hoje em dia o resultado seria um estrondoso desastre demolidor de estatísticas. Porque nos dias de hoje, caríssimos, um professor do Ensino Secundário investe quase exclusivamente nos maus e nos medianos alunos. Os outros, enfim, os outros, se quiserem chegar a algum lado, que leiam umas coisas em casa.
evva
*Retirado daqui.
8 comentários:
"O inferno recomeça nas próximas semanas..."
A primeira imagem que se forma no meu cérebro é a do "Grito" de Munch...
Sónia
Queres abrir campos de concentração? É que parece...
A escumalha pobre deveria ser afastada da escola para professores de merda não sentirem tantas dificuldades em ensinar! Ás vezes, vezes demais, tenho muita vergonha dos meus colegas e da sua mania de escrever idiotices elitistas e reaccionárias!
É quase tão fácil como fazer o oitavo ano, Não é senhor professor?
cumprimentos de um outro tipo de professor.
Tss, tss... Eu até prefiro muitas vezes os maus e os medianos alunos, constituem um maior desafio. Mas não confundir os alunos com dificuldades com 'a pobre escumalha'. Normalmente não são nada pobrezinhos, bem pelo contrário. Afecta-os sobretudo a pobreza de espiríto, deles e/ou dos pais.
evva
E não acha, caro 'anónimo', que «a pobre escumalha» tem direito a um ensino mais exigente que a prepare para as reais dificuldades da vida activa? Que tipo de cidadãos estamos a criar nas escolas, com tanto facilitismo?
evva
Colegas,
Discutamos com cordura e correcção (se não for possível a cordialidade...) os nossos problemas, dirigindo a justa indignação e revolta para o que causa (as actuais políticas educativas e o executivo que a leva a cabo) esses mesmos problemas - sublinhe-se - a todos nós.
Na minha opinião, o cerne desta questão está em primeiro lugar na definição de "alunos destes" que a evva utiliza no post. Não creio que possamos incluir aí os "alunos com NEE" (Necessidades Educativas Especiais - para quem não é professor). O texto de João Pereira Coutinho, justa ou injustamente o que faz é o retrato do aluno em risco social e que ameaça pôr em risco a sociedade manifestando interesses divergentes dos escolares. Além disso, por vezes os alunos com NEE são precisamente os alunos com mais potencial que estão a ser "subaproveitados" pelo sistema.
Em segundo lugar, penso que importa, nesta discussão aferir quais as implicações de manter estes alunos (os referidos no texto em epígrafe) no sistema. Serão elas necessariamente o dito "facilitismo"? Na minha opinião não. O compromisso de um professor é educar, para além de ensinar, portanto, o nosso objectivo principal - pelo menos no ensino Básico e Secundário - não é potenciar ao máximo as capacidades cognitivas, mas sim todas (éticas também) e na medida de cada um e nesse sentido, não perdemos tempo se o aplicarmos a educar os alunos problemáticos. Mas claro que aqui também deveríamos discutir em que condições integramos esses alunos(em turmas homogeneas ou heterogéneas? com 15 ou 30 alunos? Com professores explorados e de rastos ou respeitados e em forma?) e o que lhes oferecemos (cultura ou alfabetização, desenvolvimento crítico ou alienação de massas?). Por último, isto leva-nos à discussão das causas do facilitismo (é inegável...) reinante. Em minha opinião essa é uma reacção "facilitista" do sistema, no qual individualmente teremos ou não responsabilidade, consoante o modo como cada um reage às pressões do mesmo. Mas, independentemente das pressões, não deixa de ser uma escolha...
Sónia Duarte
(professora do grupo de Espanhol)
Estão a gozar? Tanto o texto do João Pereira Coutinho como o do Blog é perigosamente elitista e com sinais graves de defesa de algum tipo de exclusão social com base em resultados escolares...!
O discurso acerca do facilitismo é falacioso, distrai dos reais problemas e dá sempre aquela ideia do "antigamente é que era bom" tão típico nacional.
O que li aqui no blog é um sintoma grave de falta de cultura democrática e seria considerado pelos mesmos bloguistas uma gaffe enorme se fosse dito por um ministro ou secretário de estado.
Se calhar começo a pensar que há um certo facilitismo no acesso à profissão de professor e que deveria haver outra selecção. Será que não é assim, senhores tão exigentes?
JAF
O mesmo Anónimo.
Mais uma vez, opino que para conversar é preciso perceber a linguagem do outro e, nesse sentido, deveríamos afinar ponteiros quanto ao que entendemos por "facilitismo" e "exigência" e não digo aqui, mas sim nas escolas. Antigamente não era bom como hoje também não o é e, por isso, continuo à espera (lutando por isso à minha maneira) de uma escola democrática.
Concordo que os dois textos aparentam - de diferente forma - um tom elitista (creio que o deixo transparecer no anterior comentário) e concordo que os critérios de acesso à carrreira são profundamente questionáveis. Mas não o teria exposto dessa forma e menos ainda anonimamente.
Sónia Duarte
Eu não defendo o elitismo, mas uma outra forma de integração, que não nivele 'por baixo'. Nunca fui uma privilegiada e tive de lutar, estudando, e muito, pelo acesso à faculdade. Dei a volta a Portugal de casa às costas até conseguir a estabilidade que me dá o Quadro de Zona Pedagógica perto da minha residência. Mas a impressão que tenho é que hoje em dia este sucedâneo de esforço, exceptuando aqueles alunos que sonham com Curso de Medicina ou Arquitectura (que resulta em algumas aberrações de alunos), está a produzir cidadãos amorfos, que não tiveram de lutar por nada e a quem quase tudo foi dado de mão beijada. Até já comentámos no ano lectivo transacto a falta de 'rasgo' e ambição de alguns colegas mais novos, que, apesar de enfrentarem as muitas dificuldades de um emprego precário, se arrastam em contracto aqui, contracto acolá, porque dá muito trabalho concorrer para longe da casinha dos papás (alguns já têm trinta e tal anos). Estes desabafos, note-se, vieram sobretudo da parte dos delegados sindicais da escola, que tiveram muita dificuldade em recrutar para as suas 'acções de luta' a maior parte dos colegas contratados.
evva
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