quarta-feira, fevereiro 08, 2006

A CARICATURA SOMOS NÓS – parte II

Escrever num blog é muito gratificante. As respostas que recebemos transmitem uma maior sensação de responsabilidade sobre o que escrevemos. E é precisamente este o cerne do problema dos cartoons.

Na página 5 do Público de sexta-feira, 3 de Fevereiro, há uma pequena entrevista de 3 perguntas a Torgen Seidenfaden, director do “jornal dinamarquês de referência” Politiken, que esclarece muitas das dúvidas que eu tinha. A história conta-se assim:

Primeiro. No verão de 2005, um polemista dinamarquês, Kaare Bluitgen, “conhecido pela sua islamofobia”, queixa-se que “um ou dois desenhadores se tinham recusado a fazer as ilustrações” do seu livro, destinado à juventude, e que descreve Maomé como um criminoso e um pedófilo. Sem confirmar a veracidade dos factos, um outro jornal, Jyllands-Posten, noticia que as recusas se deviam a supostas auto-censuras derivadas do medo que os desenhadores tinham de ofender os muçulmanos. Estes, de acordo com o editorial do jornal, terão de aprender que a liberdade de expressão implica “desafiar, blasfemar e humilhar” o Islão.

Segundo. Em Outubro, o primeiro ministro Anders Fogh Rasmussen recusa encontrar-se com 11 embaixadores árabes que queriam protestar e pedir sanções contra o Jyllands-Posten. Torgen Seidenfaden defende que foi o facto de a maioria parlamentar do governo depender do Partido do Povo Dinamarquês, de extrema direita, que ditou a recusa.

Eu deixo aos leitores a liberdade de entenderem o que quiserem. Parece redundante dizer isto, mas por detrás desta afirmação reside a necessidade de sermos responsáveis por aquilo que dizemos e a aceitação de que há quem pense que essa liberdade não deveria existir.

andré

1 comentário:

Esplendor disse...

Cher Filipe,
O que o André quis dizer, e subscrevo, é que a origem de toda esta triste história foi uma iniciativa voluntariamente difamatória e incendiária. No fundo, e como o Eduardo Pitta tem defendido no Da Literatura, tudo isto é mais uma questão política do que religiosa, e pouco, muito pouco terá a ver com liberdade de expressão. Será contra essa sacrossanta liberdade que extremistas incendeiam embaixadas ocidentais? Não me parece. O que está em causa é a invasão, por parte da globalização ocidental, desse espaço cultural e ainda não-laicizado que é o Islão, a sua ocidentalização quase forçada, com vista para os campos de petróleo (que bem que eles ardiam no último filme de Sam Mendes, com palco na I Guerra do Golfo...). A forma como alguns, apenas alguns, se bem que muito exaltados, se deixam instrumentalizar por toda esta polémica é que nos devia fazer pensar. Parece-me o último grito de uma forma de civilização com dificuldade em adaptar-se a esta Aldeia Global que assentou arraiais à sua porta e que não soube (sabe) integrá-la porque o tentou (tenta) fazer pela força. Diga-me se isto não é do mais puro etnocentrismo. Como acabar com a exploração e submissão das mulheres no mundo islâmico, do uso do véu à excisão clitoridiana, a não ser mostrando-lhes, a eles e a elas, que há uma alternativa que, na raiz, não põe em causa as suas convicções religiosas? Crê que é de dedo, ou cartoon, em riste que se consegue alguma coisa? Eu acredito que não.

evva